Yuri Araujo
Longe de um calmo porto
Ponho-me no lugar do soldado morto,
ouvindo o estalar dos ossos em brasa,
sem o choro de apagar fogo, dos que amo
portanto, distante do amor, longe de casa,
sem os meus familiares, por quem clamo.
Depois de ter seguido ordens para matar,
ver-me, no campo da batalha da própria culpa,
sem a candura nem condição de levitar,
sem funeral, porém, ao fogo alto que chupa
a carne derretida em creme, ao me cremar.
Não posso crer, só pode ser pesadelo
esse tormento de fogo que me crepita.
Não posso crer. Só chorar mais e mais.
E orar a Deus por nova chance
em tempos de paz.
Se o exército russo
leva ao campo de batalha
seus crematórios
para apagar vestígios
de soldados mortos,
manifesto-me em litígio
estes versos tortos.
Não escrevo para julgar.
Quem julga é Deus.
Eu só posso chorar
Pois não fico em mim
e eu me transporto.
Sou um soldado morto
longe de um calmo porto,
pois eu me importo.
Não posso crer
nesse horror que eu não suporto.
